quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Da diferença entre se relacionar e torcer


É simples. Relação você tem com pessoas, daquelas que andam, respiram, têm problemas, têm delícias, etc. Torcer você torce para o time de futebol, para sua menstruação descer, para não ficar careca, para o dado cair no número seis, etc. A relação está diretamente ligada à carne, osso e espírito, enquanto a torcida se liga a um monte de coisas, e uma delas é o jogo. Então, meu Jesus Cristo, como é que podemos estar ligando a relação ao jogo de maneira tão abusiva, como andamos fazendo?

Eu quero te dizer que se você:

1 - Odeia esse negócio de ter que pensar "se eu ligar/mandar mensagem vou tá sendo pegajosa(o)?"
2 - Odeia ter que adivinhar que quando a pessoa te diz "Blablabla, qualquer dia vou ser uma árvore" ou alguma coisa sem sentido nesse nível, ela na realidade quis dizer "Bora sair de novo?" só que não disse porque pensou com a lógica do 1.
3 - Odeia  ter que se afastar, quando na verdade você quer é tá o mais perto possível, só porque a pessoa vai sentir sua falta e te procurar, porque aparentemente essa é uma lei universal

Enfim, se você não curte nada disso, me liga. Eu posso não te atender, mas não vai ser porque eu to fazendo a linha "difícil" pra você se apaixonar mais e mais até me pedir em casamento. Não. Se eu não atender vai ser porque eu to fazendo algo BEM melhor, e isso pode ser desde estar dormindo até estar caçando avestruzes na Terra dos Avestruzes. Provavelmente eu vo tá dormindo, porque eu sou contra caças. Mas enfim, o caso é que se eu não te atender vai ser por um motivo sincero do meu coração. Não vou te atender porque eu não quero. Lembra disso, "querer"? É tão bom respeitar nosso querer, gente. Pra que tanta lambança sentimental?
Mas, eu também posso te atender. Principalmente se você for um vegano fofo que curte uma horta organica, toca violao, vive do que a natureza nos dá e concorda que crianças não devem ser alfabetizadas antes dos sete anos. Aí, meu amor, pode ligar até na hora da soneca do domingo a tarde, que eu atendo. (risos, só falei isso porque eu sei que esse cara não existe muito fácil, minha soneca tá garantida)

Com toda essa preocupação que ronda nosso cotidiano amoroso, eu sinto falta da entrega e da pequena liberdade que o amor tenta trazer. Sinto falta de não ter medo de perder. E aí, bazinga! Jogamos para não perder. Pode isso, Arnaldo? Claro que pode, todo mundo que joga, joga para ganhar. Não vem com essa de que o importante é competir, gente. Se tem uma coisa que não é importante nessa vidinha de meu Deus, essa coisa é a competição. Coisa mais chata do universo. Mas, recapitulando: a gente enfiou o jogo no amor; quem joga quer ganhar; quem quer ganhar fica meio retardado. Fica, gente. Fica problemático. É só ver como tá o mundo hoje, e é tudo resultado do que? Da lógica competitiva. Nem vou falar da lógica capitalista que se enfia no meio disso tudo e quase transforma nossos relacionamentos em contratos de compra e venda e nem vou falar das datas comemorativas que nos dizem quando devemos comemorar o amor que sentimos.

Vou falar só da chatice que é ter que segurar nossos impulsos mais plenos. E não fazemos isso só com a pessoa com a qual estamos nos relacionando amorosamente, mas com todas. Algo nos prende e nos enrola a língua na hora que o corpo todo quer falar "cê tá linda(o)", seja pra quem for. Seu corpo todo, cara, quer se expressar. Mas a gente cruza os braços, porque fomos condicionados até o pescoço (na verdade até acima do pescoço) a acreditar que perder é o fim.

Deixa eu te contar uma coisa, amor: a gente perde tudo todo dia. E a gente sobrevive, eu juro. A prova disso é que você tá aí, vivinho, depois de sei lá quantos anos perdendo e perdendo e perdendo. Quanto mais perder, melhor. Perder essas amarras que a teia da sociedade nos traz. Perder verdades absolutas. Perder o grande amor da sua vida, pra perceber que nada disso te faz perder sua consciência. Salvo as vezes que a gente bebe até cair por causa dos términos. Mas, fora isso, existe uma parte sua que tá conectada com um universo, cara. Um universo, já pensou? Para agora, e pensa em quanto esse mistério é grande, e quanto nós somos pequenos...

Estar pleno, onde quer que você esteja, significa uma entrega incondicional, e só na energia do amor ela é capaz de ser. Estar pleno não envolve jogo, nem torcida, nem dados, nem primeiro ou segundo colocados, nem brigas por sms, nem ciúmes por causa de Facebook. Estar pleno tem a ver com o barulho que a gente escuta com um só ouvido, porque o outro tá grudado no pescoço de alguém que estamos abraçando. E a gente fica ali, só sendo.

Aí, não precisa torcer pra nada. Já pensou, que alívio?